quinta-feira, maio 24, 2012

As armas e os barões

Assim se inicia o poema épico de Luís Vaz de Camões, curiosamente parece ser assim que termina a República da Guiné-Bissau... sendo as armas e os barões outros que não os Camonianos...
De proto-Estado respeitado a estado em estado-de-sitio bastaram 37 anos de desmandos e fartar vilanagem por parte de alguns para desgraça de todos os outros.
De uma luta de libertação nacional exemplar que a todos inspirou respeito e consideração a uma pleiade de golpes-de-estado-tiro-no-pé que inexoravelmente nos garantiram lugar cativo entre os "damnés de la terre".
De um estado nação a um estado de nações, perdidos os valores de antanho que nos mantinham unidos e focados nos objectivos de uma pátria, uma só nação, um futuro melhor... as crianças são as flores da revolução, etc. e tal... hoje rouba-se o futuro às crianças e à nação em prol de interesses escusos, mesquinhos e egocêntricos.
Lembra-me o "poema negro": "não sei por onde vou, não sei para onde vou, sei que não vou por aí!". Infelizmente o caminho rejeitado é o do progresso, da prosperidade, do respeito pelo outro, da cidadania, do urbanismo e do civismo.
Depois há os outros, como eu, que de fora nos vamos insurgindo, treinadores de bancada/sofá, mas que podemos julgar com base nos slow motions dos replays televisivos e como críticos da obra feita temos sempre razão... ou razões...ainda que contraditórias, de acordo com a "cor" dos "óculos" que usamos... no interim os locais continuam sobrevivendo, lutando, aguentando estoicamente a estroinice de alguns que têm o poder de poder fazer pois detêm as armas e não hesitam em usá-las e de outros que, livres da pressão de ter de viver sob pressão, vão dando "bitaites" mais ou menos educados sobre como devia ser o que não é.
Hoje o meu pai perfaz 82 anos, lutou pela independência do seu país, como muitos outros da sua geração, sofreu as agruras da prisão política, idealizou com Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Fernando Fortes, Luís Cabral e Júlio Almeida, naquela casa no bairro da Tchada, em Bissau, a 19 de Setembro de  1956, uma Guiné onde coubessemos todos em harmonia. Viu o desaparecimento físico de uma boa parte dos seus "camaradas"; viu o desmoronar do sonho de uma Guiné independente e próspera; assiste aos eventos bélicos da actualidade que coartam o desenvolvimento sustentável do país; assiste ao descalabro social e moral do país. Assiste ao desmoronar da utopia que o levou a insurgir-se contra o poder colonial. Hoje, não deve estar orgulhoso com o rumo que a Guiné-Bissau independente leva. Mas de certeza que não perdeu a esperança de assistir ao surgimento de uma Guiné melhor, tal como a idealizaram nos idos de 1956... sem armas nem barões...